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Lei 13.546/17: Pena maior para quem dirige embriagado? Fim do dolo eventual? Explico.

No final do ano passado muitos de vocês devem ter recebido por meio de mídias sociais e afins, mensagens desesperadas que informavam que a pena para o crime de embriaguez ao volante teria aumentado para 05 a 08 anos de reclusão.

Tal informação está correta? NÃO, não está!

A Lei 13.546/17 não alterou absolutamente nada no que tange o delito de embriaguez ao volante, previsto pelo artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, que continua com a pena de 06 meses a 03 anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Na realidade, a nova alteração legislativa promoveu mudanças, entre outros, no artigo 302 do CTB, que versa sobre a prática de homicídio culposo na direção de veículo automotor.

A modificação do artigo ocorreu com a inclusão do parágrafo 3º, que versa no sentido de “Se o agente conduz veículo automotor sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência” a pena será de “reclusão, de cinco a oito anos, e suspensão ou proibição do direito de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.”

Ou seja, a Lei 13.546/17 adicionou uma forma qualificadora do homicídio culposo no trânsito, quando este é cometido por motorista embriagado ou sob a influência de qualquer outra substancia psicoativa que determine dependência.

Pois bem, simples de ser compreendido não é mesmo?

Mas qual a razão de tal alteração?

Antes da atual mudança, a pena para o homicídio culposo cometido por agente que dirigia veículo automotor embriagado era de 02 a 04 anos de reclusão, ou seja, autorizava, em grande parte dos casos, a substituição da pena privativa de liberdade (prisão) por restritivas de direitos (multa, prestação de serviços à comunidade, limitação de fim de semana, etc.), prevista pelo artigo 44 do Código Penal.

Com isso, criava-se grande indignação por parte de familiares das vítimas, sociedade, e Ministério Público pelo fato de uma pessoa que tirou a vida de alguém, não ter a punição que “mereceria”.

Dessa forma, passou a adotar-se reiteradamente, para os casos de homicídio no trânsito causados por motorista alcoolizado ou sob efeito de qualquer outra substância psicoativa, o instituto do dolo eventual.

Em uma explicação simplória, o dolo eventual é uma modalidade de dolo, que ocorre quando o agente representa o resultado como possível, assume o risco de produzir esse resultado e ainda atua com indiferença sobre o bem jurídico.

Ou seja, por exemplo, o motorista sabendo que está bêbado, consequentemente com suas habilidades motoras e mentais alteradas, sabe que corre o risco de matar alguém se assumir a direção de um veículo automotor. Mas mesmo assim, assume o risco sendo indiferente ao resultado que já previa.

Dessa forma, imputando a todos os homicídios no trânsito com motoristas alcoolizados, a modalidade do dolo eventual, os agentes seriam enquadrados no artigo 121 do Código Penal, com pena de 06 a 20 anos de reclusão, sendo levados ao Tribunal do Júri para julgamento.

Para satisfazer os anseios punitivistas da sociedade e, principalmente, do Ministério Público, tais “injustiças” – leia-se, a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, quando do enquadramento no homicídio culposo – seriam afastadas.

Contudo, a discussão acerca do dolo eventual tornou-se pauta de inúmeras divergências entre juristas, seja em obras doutrinárias, seja, principalmente, em discussões judiciais.

Entendo que, obviamente, não se pode engessar o direito e imputar dolo a todo motorista alcoolizado que cometesse um homicídio no trânsito. Novamente sintetizando uma (imensa) discussão existente entre os penalistas, não se pode presumir que, em todos os casos, o motorista assumiu o risco, atuou com indiferença se iria matar alguém ou não. Cada caso é um caso.

Dessa forma, a fim de amenizar tal discussão, o legislador aumentou a pena privativa de liberdade para o crime de homicídio culposo no trânsito cometido por motorista embriagado ou sob efeito de substância psicoativa, fixando-a no montante de 05 a 08 anos de reclusão, podendo o homicídio culposo na direção de veículo automotor – em alguns casos – ter pena mais severa do que se o réu fosse condenado pelo crime de homicídio doloso na forma do dolo eventual.

Será o fim do dolo eventual nos casos aqui discutidos? Nos parece que não chegará a tanto, mas, de certa forma, não teremos mais a “regra” que foi criada ultimamente, que em todos os casos de homicídio no trânsito, provocado por agente alcoolizado, a modalidade do dolo eventual teria de ser adotada.

Ninguém é dono da razão, e discussões acerca do tema ainda irão existir (ainda bem!), pois essa é a essência do direito. Porém, não vislumbro nenhuma outra motivação para a alteração legislativa aqui tratada, se não a que expus acima.

De qualquer forma, se beber, não dirija!

Victor Waquil Nasralla

Advogado Criminalista

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